IIº Capitulo de ERRO CRASSO


Quinto Servílio levantou-se devagar. Afagou as pregas da toga senatorial. Encarou de frente a plateia que antevia o remate e disse com a voz quase murmurante. “Há hoje homens em Roma que querem ter o “toque de Midas”. Homens gananciosos. Homens sem poesia… Homens sem amor. Serão também eles desprovidos de inteligência, ou apenas ambiciosos? Não os deveríamos afogar no Tibre? Talvez assim todo povo pudesse beneficiar das areias douradas e a riqueza ser mais bem distribuída”.
Quinto Servílio olhou de soslaio para Crasso. Os convivas sorriam, divididos entre a metáfora financeira e o financiamento da metáfora. “Idiota chapado. Pedante de merda! Armado em “progressista”. Aposto que é partidário do Júlio”. Crasso teve vontade de lhe dizer: “no podex é um descanso!”. Conteve-se. Tinha de resistir a provocações. Crasso era aliado de Júlio, principalmente por ser uns dos seus maiores credores. Além disso estavam em curso negociações secretas que lhe trariam ainda mais riqueza... Fez de conta que não era nada com ele. Regurgitou mais um pouco de bílis em cima do escravo de serviço e resistiu à tentação de voltar a comer naquela noite, embora os túbaros de elefante em vinagreta balsâmica estivessem com óptimo aspecto.
Invejosos…Todos invejosos! Quase todos aqueles idiotas dependiam dele. Marco Crasso era, provavelmente, o homem mais rico de Roma. Negócios em todo o Mediterrâneo. Da Gália Cisalpina à Sicília; da Espanha à Capadócia; da Trácia à Bítinia; da Numídia à Palestina. Só os Partos, a Oriente, resistiam à fúria romana fechando a rota da seda. Crasso não gostava definitivamente dos Partos!
Os negócios de Crasso eram tentaculares: accionista maioritário do Banco Popular da Etrúria e do Banco Senatorial de Investimentos… A exploração do off-shore de Ibiza e da zona franca de Rodes… Proprietário da rede de móteis “Tosão de Ouro” que se estendia ao longo de toda a Via Ápia… Dono da famosa escola de gladiadores “E Pluribus Unum”… Explorador do maior negócio de escravos do império, a “Manus Power”… A ”Mare Nostrum”, transitários e despachantes oficiais sediada no porto de Óstia... A sociedade de advogados “In Dubio Pro Reo”... A corretora “Pecunia Non Olet”, que especulava nas bolsas de Roma, Siracusa e Alexandria... Os talhos ”Agnus Dei”... Os supermercados “Quod Abundat Non Nocet”… Os ressorts de férias “Capri C`est Fini” e “Oráculo de Delfos”… Os incontornáveis “Sila`s Place” e “Marius Bar”, pontos de passagem obrigatória na noite romana… “Monte de Vénus”, o melhor bacanal da “cidade eterna”… As sapatarias ”Par Inter Pares”, que vendia as melhores caligulae da Itália... A concessão do casino “ Alia Jacta Est”, na zona do Rubicão… A consultora “In Medio Virtus”… A empresa de sondagens “In Absentia”, ligada à universidade “Veni Vidi Vinci”… As capelas mortuárias “Sine Die”… As adegas “Dionísio Alves”…Enfim, Crasso tinha a mão em tudo. Mas a principal fonte de rendimentos era o imobiliário. Através da “Usucapião Ilimitada” e da construtora “Casa Nostra”, os prédios dos bairros da Subura eram sistematicamente incendiados por rufiões contratados e, posteriormente, os terrenos comprados ao preço da chuva. Novas “insulae”, em condomínio fechado, surgiam como cogumelos a preços não bonificados, financiados pelos bancos de Crasso e vendidas aos libertos gregos e da Ásia Menor. Crasso era dono de meia Roma. Os escrúpulos de Crasso reduziam-se à dimensão do sestércio, ao nível do quilate. Os escrúpulos de Crasso tinham sempre um cifrão na ponta.
Continua dia 28 de outubro o IIIº Capitulo
JORGE FERREIRA PINHEIRO

2 comentários:

Silvares disse...

Este Crasso ainda se vai perder investindo em produtos financeiros tóxicos!

Jorge Pinheiro disse...

Nem mais... e de que maneira!

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